quinta-feira, 9 de junho de 2011

Aprender na era digital

O sucesso fenomenal das tecnologias de entretenimento digital, desde os jogos virtuais em rede, passando pelas plataformas de compartilhamento de conteúdo, até as redes sociais devem servir de inspiração para recolocar a aprendizagem como uma atividade atraente.

Por Romain Mallard*

"Desejar o saber é da natureza do ser humano" constatava Aristóteles, na Antiguidade. Esse desejo levou os homens da sociedade industrial a organizar a vida dos cidadãos em três grandes fases: a juventude, quando por volta de 20 anos dedicam-se a aprender a "vida ativa", que dura em média 30 anos, na qual devem ser produtivos; e a "melhor idade", quando sobram de 10 a 30 anos para aproveitar o que conseguiram conquistar nas primeiras etapas da vida.

Nesse modelo, o Estado e a família ficaram responsáveis por providenciar a infra-estrutura necessária à fase inicial de aprendizagem. O sistema educacional foi pensado para desenvolver nos indivíduos as aptidões culturais, científicas e técnicas para que eles se tornem cidadãos produtivos e retribuam por meio de tributos que vão financiar a formação das novas gerações.

Hoje, a era pós-industrial deixa claros os limites deste sistema. Primeiro, porque os estados enfrentam grandes dificuldades estruturais para manter um sistema educacional de qualidade que seja capaz de reduzir o gap entre estudantes formados e profissionais capacitados. É que o conhecimento das organizações é tão complexo e avançado que as formações genéricas tendem a gerir profissionais relativamente despreparados para a realidade empresarial.

Segundo, porque o ritmo com o qual a humanidade gera novos conhecimentos, nas mais diversas áreas, exige uma aprendizagem constante de qualquer profissional ao longo da sua vida. Tão importante quanto o conteúdo da formação é a capacidade de aprender a aprender; ou seja, de se tornar um eterno estudante.

Por fim, porque as evoluções tecnológicas das últimas duas décadas possuem um impacto ainda subestimado sobre os sistemas de ensino/aprendizagem. Isso tudo nos leva a refletir sobre algumas das competências-chave para aquele que se propõe a aprender algo na era digital, a quem chamo de aluno ou estudante.

Em primeiro lugar, esse novo estudante deve saber lidar com a abundância de recursos. Hoje, se você deseja aprender, por exemplo, sobre o estado da arte de sistemas de busca, é possível acessar milhares de conteúdos que tratam a questão, em todos os níveis. Porém, quem conhece o canal da Universidade de Berkeley, no YouTube, pode assistir à aula que o Sergey Brin (fundador do Google) ministrou na própria Universidade.

A quantidade de informação armazenada na rede cresce de maneira exponencial e as ferramentas de busca melhoram cada vez mais o acesso às informações. Em contrapartida, raros são os estudantes capazes de manter o foco em sua busca, sem se deixar levar por outros tantos assuntos que aparecem durante suas pesquisas na internet.

Na nuvem de informações e serviços que constitui a web para qualquer área de conhecimento que se deseje explorar, existem inúmeros recursos cada vez mais sofisticados e capazes de aproximar mais e mais os alunos de seus objetivos. Mas a relação com as fontes de informação muda, já que saber usar recursos avançados e compilar resultados que realmente sejam pertinentes ainda é um desafio na era digital. É preciso aprender a selecionar o relevante e descartar o resto.

Um segundo ponto fundamental é a capacidade de contribuir com o processamento e a criação de recursos, por meio de redes de indivíduos cada vez mais qualificados. A famosa Wikipédia, com mais de três milhões de artigos em 255 línguas, foi (e ainda é) construída com a contribuição de seus usuários, demonstrando o poder da abordagem colaborativa na construção de referenciais eficientes. A principal evolução, conhecida como Web 2.0, foi a melhoria ergonômica das ferramentas de produção e difusão de conteúdos, facilitando a criação individual e participativa. A partir daí, foram desenvolvidos mecanismos relativamente sofisticados e ágeis como os Wikis e as redes sociais. O domínio dessas soluções constitui mais um desafio para o aprendiz de hoje: colocar-se como contribuinte pertinente neste espaço. Dominar os recursos de produção é um passo fundamental para que o estudante, por meio da sua participação, desenvolva suas habilidades cognitivas. Escrever toma outras dimensões.

A terceira competência chave para o estudante da era digital, depois da seleção das fontes e da capacidade de contribuição, é saber criar o seu próprio ambiente de aprendizagem on-line, não só em termos de conteúdo, mas também em serviços. No modelo das páginas de perfis das redes virtuais, existe uma forte tendência a oferecer ao usuário uma quantidade surpreendente de recursos (WidGets) para personalizar tanto as fontes de informação que ele costuma consultar, quanto os serviços web que ele utiliza nas páginas pessoais, como Igoogle, my Yahoo ou Netvibes. Assim, ferramentas como o MOODLE (atualmente considerada a melhor plataforma de aprendizagem de código aberto disponível no mercado) se tornaram recursos de alto potencial para definir ambientes interativos poderosos, sem a obrigatoriedade de possuir conhecimentos tecnológicos avançados para poder utilizá-lo.

Porém, é necessário dizer que tais plataformas ainda trabalham com uma estrutura adaptada à secular tradição educacional, na qual a responsabilidade do aluno na construção de seus percursos é relativamente limitada, reduzindo sua atuação ao que já está previamente estabelecido pelos "educadores".

O próximo desafio do sistema de educação é oferecer aos estudantes plataformas que eles mesmos possam adaptar e compartilhar em função de seus desafios, de seu estilo de aprendizagem e de suas lacunas de conhecimento. O sucesso fenomenal das tecnologias de entretenimento digital, desde os jogos virtuais em rede, passando pelas plataformas de compartilhamento de conteúdo, até as redes sociais devem servir de inspiração para recolocar a aprendizagem como uma atividade atraente.

"Temos tendência a superestimar o impacto de uma tecnologia em curto prazo e a subestimá-lo no médio e longo prazo", afirma Roy Amara, do Instituto para o Futuro. As tecnologias educacionais, após terem muitas vezes decepcionado os usuários ao propor soluções lentas e pouco criativas, estão entrando na maturidade ao passar a oferecer recursos cada vez mais interessantes, poderosos e interativos para os estudantes construírem conhecimento e desenvolverem habilidades. Cabe a quem quiser aproveitar todo este potencial desenvolver suas aptidões de aprendiz digital, experimentando e filtrando. Na era digital ou analógica, o sucesso sempre vai depender do empenho de quem deseja aprender.

* Romain Mallard é diretor de tecnologia da Digital SK. Engenheiro Mecânico e Especialista em Gestão da Inovação pela Universidade de Tecnologia de Compiègne (UTC), na França 

Fonte: Administradores.com.br

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